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Interdição de Suplementos Alimentares, Anabolizantes e Toxinas Botulínicas (Botox) e o Poder de Polícia da Anvisa

Evaristo

Evaristo Araújo

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As recentes decisões da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), amplamente noticiadas, de interditar todos os suplementos alimentares de uma mesma empresa, bem como lotes falsos de toxinas botulínicas e anabolizantes, após constatar produção em condições insalubres e disponibilização irregular para consumo no mercado, evidencia a amplitude do poder de polícia sanitária da Agência. A medida ilustra de forma concreta como a autoridade reguladora exerce sua função de proteger a saúde pública, utilizando instrumentos administrativos de caráter preventivo e sancionatório.

O poder de polícia da Anvisa e sua base legal

O poder de polícia da Anvisa tem fundamento na Lei nº 9.782/99, que define o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária e atribui à Agência competência para regulamentar, controlar e fiscalizar produtos e serviços que envolvam risco à saúde pública.

Além disso, a Lei nº 6.437/77 dispõe sobre infrações à legislação sanitária federal e estabelece as sanções aplicáveis, como advertências, multas, interdição de produtos e serviços e, quando necessário, a adoção de medidas cautelares.

Assim, a Anvisa pode adotar medidas imediatas — como suspensão da fabricação ou comercialização de produtos — sempre que identifique risco sanitário relevante, ainda que o processo administrativo não tenha sido concluído.

Processo administrativo e medidas preventivas

As medidas cautelares têm natureza preventiva, evitando que riscos atinjam a população antes da conclusão do processo. Porém, sua aplicação está inserida em um processo administrativo sanitário regido por princípios constitucionais como contraditório e ampla defesa.

Nesse contexto, a empresa autuada possui instrumentos jurídicos para questionar a medida, apresentar provas, interpor recursos e, em casos específicos, buscar tutela judicial.

Instrumentos de defesa e a questão do efeito suspensivo

Talvez o ponto mais relevante do processo administrativo relativo às medidas cautelares sanitárias seja o efeito suspensivo do recurso dirigido à Diretoria Colegiada (Dicol) da Anvisa.

Esse dispositivo prevê que a interposição de recurso suspende automaticamente os efeitos da medida cautelar. Na prática, significa que atividades suspensas ou produtos interditados podem continuar a operar ou circular até que a Diretoria se manifeste.

Esse efeito suspensivo é controverso: suspender os efeitos de uma medida justificada pela existência de risco concreto e iminente à saúde apenas pela interposição de um recurso pode ser visto como consequência contraditória de um simples ato processual.

A interpretação crítica encontra respaldo também na Lei nº 6.437/77, que confere efeito suspensivo a recursos somente em relação a penalidades pecuniárias, excluindo da suspensão outras obrigações impostas na autuação.

Contudo, o Regimento Interno da Anvisa determina que o recurso administrativo será recebido no efeito suspensivo, ressalvando que a Diretoria Colegiada poderá afastar esse efeito quando houver risco sanitário relevante.

Portanto, o recurso administrativo transfere à Anvisa — mais especificamente à sua Diretoria Colegiada — o ônus de analisar, em caráter preliminar, a manutenção ou não do efeito suspensivo.

Do ponto de vista estratégico, essa possibilidade deve ser avaliada com cautela pelas empresas: se o efeito suspensivo for posteriormente afastado, os ônus econômico, operacional e reputacional podem ser ainda maiores. Além disso, juridicamente, a responsabilidade da empresa pode se agravar caso algum dano decorra da continuidade de suas atividades no período em que a medida estava suspensa.

O caso demonstra a importância de programas robustos de compliance regulatório e de infraestrutura adequada às exigências sanitárias, reduzindo o risco de autuações. Também reforça a necessidade de assessoria jurídica especializada, capaz de auxiliar na condução de defesas administrativas e na avaliação estratégica quanto ao uso do efeito suspensivo previsto em lei e regulamento.

Nosso escritório acompanha de perto a evolução do direito regulatório da saúde e atua há mais de duas décadas na defesa de empresas e associações, oferecendo suporte estratégico para a prevenção de riscos, a condução de processos administrativos e a proteção da continuidade dos negócios.

Evaristo Araujo | Especialista em Direito da Saúde |  ANVISA |

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